Caso do desaparecimento do pescador em São Filipe: Revolta de familiares com críticas e manifestações à volta das operações de busca e salvamento


As operações conduzidas pela autoridade marítima em São Filipe (AMP) foram alvo de muitas críticas, não só pelo grupo de pescadores locais, como também por parentes, amigos e emigrantes foguenses radicados nos Estados Unidos da América (EUA). É que esses cidadãos acusam o Instituto Marítimo e Portuário de Cabo Verde (IMP) pelo atraso no auxílio aos dois pescadores (Xalé e Olegário) na altura do acidente, pela falta de meios e erros nos trabalhos de busca, resgate e salvamento.

Conforme familiares e vizinhos, "Xalé", que esteve na companhia de Silvestre Barros (Olegário), de 65 anos, partiu para a faina de pesca por volta das 04h30 de segunda-feira, 16, e numa altura em que se preparavam para regressar à terra, no dia seguinte, o bote em que os dois se encontravam, sofreu um furo na parte da carena, obrigando a que os dois se atirassem ao mar imediatamente, junto à praia da Cadeia da Betanha, cidade de São Filipe.

Olegário, que conseguiu nadar até chegar à praia mais próxima, assegura que tinha alertado às autoridades marítimas sobre o ocorrido, para que providenciassem, rapidamente possível, à busca do seu companheiro, mas devido ao atraso da equipa de busca e salvamento, não foi possível localizar o colega Xalé.

Parentes e amigos revoltados com as autoridades marítimas

De referir que o IMP, depois de quatro dias de buscas sem sucesso, mandou encerrar as operações nesta quinta-feira, 19, o que tem provocado algum descontentamento e revolta no seio dos parentes e amigos do desaparecido Xalé.

Parentes do pescador desaparecido mostram-se “descontentes” com a suspensão e a forma como decorreram as operações de busca. Estes acusam o Instituto Marítimo e Portuário do Fogo pelo atraso na chegada ao local para o procedimento das operações. Perante isso, o Delegado do IMP, Carlos Rodigues garante que as buscas foram suspensas devido ao estado do mar, tendo registado uma "ondulação alta" e "vento forte", durante os dias de busca.

Um outro parente ouvido por este jonal acusa o IMP de preocupar-se mais com a apanha e venda da carne de tartarugas marinhas, do que a própria vida de "qualquer" pescador que labuta diariamente para o "sustento" da família.

Para Jorge Humberto, técnico de pesca que reside nos EUA, o Serviço de Busca e Salvamento Marítimo a ser prestado em Cabo Verde, deve seguir, no mínimo, os padrões internacionais recomendados pela Convenção Internacional para a Salvaguarda da Vida Humana no Mar (SOLAS). Este afirma "categóricamente" que Cabo Verde não está preparado para enfrentar os acidentes marítimos, "mormente" preocupado com os que, de forma "rústica e tradicional", desenvolvem as suas actividades de pesca para a sua sobrevivência.

Falta de fiscalização e de controlo costeiro no arquipélago

De acordo com o também Técnico de Pesca, Carlos Andrade, Cabo Verde necessita de recursos humanos e materiais necessários e adequados para melhor fiscalização e controlo das zonas costeiras do arquipélago, sobretudo no que se refere à documentação das embarcações de pesca e seus respectivos tripulantes, no exercício do seu labor.

“Temos que assumir que não temos meios para fiscalizar as nossas águas, o que torna difícil fazer uma boa gestão do sector marítimo”, anota, recomendando que as autoridades marítimas adoptem medidas legislativas adequadas para o estabelecimento da estrutura, organização e atribuições do serviço de busca e salvamento marítimo, com o fim de assegurar a prossecução dos objectivos delineados pela SOLAS.

Embora o sector da pesca represente a sobrevivência de mais de 30% (%) da população de Cabo Verde, muitos cidadãos estão preocupados com o exercício da actividade da pesca sem o devido cumprimento de normas exigidas para tal.

Luís António (Tuitxe) Canuto, um cidadão foguense radicado nos EUA e que goza as férias todos os anos na ilha do Fogo, aponta, por seu turno, o dedo às demais autoridades marítimas cobo-verdianas pela falta de fiscalização e controlo das embarcações de pesca e pescadores artesanais na ilha. É que, para este cidadão, todos os profissionais da pesca devem cumprir as regras básicas de segurança, tais como o uso de coletes salva-vidas e estarem devidamente credenciadas e habilitadas para a faina.

"Do meu ponto de vista, todas as embarcações de pesca local, incluindo as de boca aberta, devem possuir coletes de salvação para toda a tripulação, para em caso de naufrágio, serem utilizados", precisa.

Como uma das medidas de prevenção de acidentes susceptíveis a perdas de vidas humanas no mar, este "Tuitxe" recomenda uma acção fiscalizadora rigorosa, não só para evitar atividades ilícitas, mas também para sensibilizar a comunidade marítima para a obrigatoriedade do uso de colete salva-vidas e de outros dispositivos de segurança. "Mas mais: são muitos os pescadores que, sequer, sabem nadar e nem estão documentados para o exercício da actividade piscatória, nomeadamente a cédula marítima, licencas de pesca, entre outros, aponta

Miguel Soares Barbosa, outro emigrante cabo-verdiano residente nos EUA e conhecedor de segurança marítima, reconhece que Cabo Verde enfrenta um problema complexo no sector das pescas. “As atividades da pesca têm um risco acrescido, já que estão expostas às condições atmosféricas e do mar, que contribuem com um elevado grau de imprevisibilidade”, refere, explicando que tipicamente, cada acidente tem as suas causas e circunstâncias próprias. Entre as mais frequentes, adianta, estão “fatores humanos, externos e falhas técnicas ou do material”.

Desta vez, as vozes de protesto dos homens do mar parecem ser ouvidas pelas autoridades cabo-verdianas. Entretanto, permanecem as dúvidas quanto ao uso obrigatório de meios de segurança exigidos nas embarcações de pesca artesanal.

Porém, depois desta tragédia ocorrida no mar da Cidade de São Filipe, ilha do Fogo, a falta de uso dos coletes salva-vidas foi, aliás, um dos argumentos mais contestados no seio dos emigrantes foguenses radicados nos EUA e ouvidos pelo Asemanaonline.

Nos últimos tempos, o mar voltou a matar os homens, que dele fazem vida em Cabo Verde. A polémica quanto à falta de meios de socorro estalou, com todos os dedos apontados às autoridades, em especial à capitania local e ao Instituto Marítimo e Portuário.

Celso Lobo


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