PR de Cabo Verde promulgou alteração ao fundo soberano que devolveu em janeiro

De acordo com o teor da publicação feita em Boletim Oficial, com data de 14 de abril e que entrou em vigor no dia seguinte, consultada hoje pela Lusa, a promulgação pelo chefe de Estado foi feita em 08 de abril, duas semanas após a aprovação da proposta do Governo pelo parlamento.

A Assembleia Nacional confirmou em 25 de março, em segunda deliberação, a proposta de lei de alteração à supervisão do Fundo Soberano, devolvida em janeiro pelo Presidente da República e que o Governo manteve inalterada. Foi confirmada com 38 votos a favor dos deputados do Movimento para a Democracia (MpD, maioria) e três da União Caboverdiana Independente e Democrática (UCID), enquanto 25 deputados do Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV, oposição desde 2016) votaram contra.

"O Governo entende que devemos manter a proposta como inicialmente feita e aprovada nesta casa parlamentar", afirmou o vice-primeiro-ministro e ministro das Finanças, Olavo Correia, durante o debate da proposta, inalterada face à que tinha sido aprovada em novembro, alterando a competência da supervisão do Fundo Soberano de Garantia do Investimento Privado (FSGIP), de 100 milhões de euros, equivalente a 5% do PIB nacional, do Banco de Cabo Verde (BCV) para a Auditoria Geral do Mercado de Valores Mobiliários (AGMVM).

O Presidente cabo-verdiano, José Maria Neves, anunciou em 29 de janeiro que devolveu ao parlamento a alteração à lei proposta pelo Governo da supervisão daquele Fundo, por não entender a motivação da alteração, defendendo que devia permanecer na alçada do BCV.

O artigo 136 da Constituição da República de Cabo Verde refere que, no caso do veto a um diploma da Assembleia Nacional, e "se esta, no prazo de 120 dias contados da data da receção da mensagem do Presidente da República, confirmar a deliberação que o aprovou por maioria absoluta dos deputados em efetividade de funções, o Presidente da República é obrigado a promulgá-lo no prazo de oito dias".

Na carta divulgada pela Presidência da República em janeiro, dirigida ao presidente da Assembleia Nacional, que aprovou a alteração ao artigo 21.º da Lei n.º 65/IX/2019, de 14 de agosto, prevendo a passagem da supervisão do Fundo do BCV para a AGMVM, José Maria Neves pedia "melhor análise e ponderação" ao parlamento, como prevê a Constituição, "antes da decisão formal de promulgação ou veto".

O presidente do parlamento esclareceu que após pedidos de parecer foi concluído que esta devolução é um veto político, sendo por isso a proposta do Governo discutida como segunda submissão, enquanto os deputados do PAICV recusaram esse entendimento, afirmando que não houve veto e sim uma via de diálogo aberta pelo chefe de Estado.

Na apresentação da mesma proposta, o vice-primeiro-ministro recordou que o Fundo "é um instrumento de investimento coletivo" e que o quadro de supervisão "está claramente definido ao nível do mercado de capitais, sendo incumbido à AGMVM".

"Sendo assim, vamos ter duas entidades a supervisionar o FSGIP. Uma diretamente, que é a AGMVM, em relação ao próprio Fundo Soberano, e uma outra, que é o banco central, que faz a supervisão e a regulação das instituições que irão fazer a aplicação dos ativos do fundo", sublinhou, justificando a opção de manter a proposta.

Da parte do PAICV, que em novembro já tinha votado contra a proposta, levantando os mesmos argumentos invocados pelo Presidente da República, o deputado Démis Almeida afirmou que esta alteração vai "afrouxar da supervisão" do Fundo, ao sair da dependência do BCV.

Lamentando a atitude do Governo, o deputado recordou que após a devolução da proposta pelo Presidente, o primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva, chegou a admitir uma "alteração pontual", para manter a supervisão no BCV, o que acabou por não acontecer.

José Maria Neves, antigo primeiro-ministro (2001 a 2016, pelo PAICV), recordou na carta em que devolveu a proposta ao parlamento que "o BCV já dispõe de competências legais de supervisão, nomeadamente em termos de matéria contraordenacional, iguais ou até superiores" às que, disse, "pretende o Governo com a `revisão dos aspetos do regime contraordenacional dos Organismos de Investimento Coletivo, no sentido de garantir o respeito pelas normas previstas no respetivo regime jurídico`".

"Por outro, o BCV já vem exercendo a supervisão das instituições por ele reguladas e supervisionadas há já várias décadas, pelo que já acumulou um leque bastante vasto de experiências vivenciadas e de `expertise`, para além de dispor de muito mais recursos (humanos, materiais, tecnológicos, etc.) do que a AGMVM", lê-se.

Trata-se da primeira decisão do género, conhecida publicamente, de José Maria Neves, empossado quinto Presidente da República de Cabo Verde em novembro passado, e eleito com o apoio do PAICV.

O FSGIP foi criado em 2019 após a extinção do International Support For Cabo Verde Stabilization Trust Fund, para garantir a emissão de valores mobiliários, em particular títulos de dívida, por empresas comerciais privadas de direito cabo-verdiano em mercados regulamentados para financiamento dos respetivos investimentos, e para conceder garantias a operações financeiras de natureza equivalente de que sejam beneficiárias empresas comerciais privadas de direito cabo-verdiano.

A Semana com Lusa

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