Juiz manda retirar Amadeu Oliveira da sala de audiência por “desrespeito” ao tribunal
Tudo aconteceu no momento em que a testemunha Nilton Rodrigues, oficial da Polícia Nacional, respondia a questionamentos da equipa de defesa de Amadeu Oliveira, tendo a juiz chamado atenção da advogada que pedia esclarecimentos para “não massacrar a testemunha”.
Acto contínuo, o arguido perguntou, “isto é massacre?”, ao que a juiz advertiu Amadeu Oliveira de que ele “não pode se manifestar” durante a inquirição das testemunhas.
“Prenda-me, prenda-me”, respondeu o arguido, com os dois braços estendidos em direcção à mesa do colectivo de juízes.
De imediato, a juiz-presidente Circe Neves disse que não admite falta de respeito ao tribunal e aos juízes, que o arguido tem estado “mais à-vontade do que deve” durante as sessões de julgamento, mas que desta vez iria ordenar a sua retirada temporária da sala de audiências e que o arguido fosse conduzido à cadeia.
Passado este momento, e já sem a presença do arguido na sala, o julgamento prosseguiu com a audição das testemunhas, seis no total e todos da Polícia Nacional (PN), afectos à Unidade de Estrangeiros e Fronteiras de São Vicente.
O momento alto desta sucessão de depoimentos dos agentes, que se ocuparam da fronteira do Aeroporto Internacional Cesária Évora no dia em que Amadeu Oliveira e o seu constituinte, Arlindo Teixeira, saíram do País, ocorreu quando a juiz-presidente constatou “contradição com relevância” nas declarações de três delas, nomeadamente, o supervisor de serviço naquele dia e sub-chefe da PN, José de Morais, e as agentes Lucibela dos Santos e Maria Arcília Rodrigues.
Assim, o tribunal pediu a acareação das testemunhas José de Morais e Lucibela dos Santos, uma vez que a testemunha Maria Arcília Rodrigues já tinha sido dispensada e não se encontrava nas instalações do tribunal.
Basicamente, a juiz-presidente queria saber com esta diligência, que o próprio tribunal entendeu levantar, se a agente Lucibela dos Santos confirmava perante o supervisor de turno José de Morais que foi ele quem se dirigiu naquele dia da viagem do arguido Amadeu Oliveira e do seu constituinte ao guichê onde as duas agentes se encontravam avisando-as de que Arlindo Teixeira iria viajar naquele dia e que não havia impedimento no sentido de este sair do País.
Por seu lado, o supervisor José de Morais afirmou que não se antecipou no sentido de ter ido ao guichê avisar as duas agentes de que Arlindo Teixeira se encontrava no aeroporto para viajar e que “não havia restrições” quanto à saída dele.
Outra contradição, segundo a juiz-presidente, prende-se com o facto de a testemunha José de Morais afirmar “com afinco” que se tratou de uma decisão conjunta, ou seja, sem influência dele enquanto supervisor, sobre a saída de Arlindo Teixeira do País, quando as duas agentes dizem “precisamente o contrário”.
Feita a acareação, as testemunhas mantiveram o mesmo sentido das declarações prestadas anteriormente, tendo a testemunha Lucibela dos Santos acusado o supervisor de “faltar à verdade de forma grosseira e por má-fé”, enquanto este denunciou “um complôt das duas para falar a mesma linguagem”.
O julgamento prossegue na sua oitava sessão nesta quinta-feira, 08, as 15:00, com a audição de seis testemunhas arroladas pelas defesa do arguido.
O advogado Amadeu Oliveira está acusado de um crime de atentado contra o Estado de Direito, um crime de coacção ou perturbação do funcionamento de Órgão Constitucional e dois crimes de ofensa a pessoa colectiva.
Foi detido no dia 18 de Julho de 2021 e, dois dias após a detenção, o Tribunal da Relação do Barlavento, sediado em São Vicente, aplicou a prisão preventiva ao então deputado nacional eleito nas listas da União Cabo-verdiana Independente e Democrática (UCID) pelo círculo eleitoral de São Vicente.
No dia 14 de Fevereiro, como resultado de uma Audiência Preliminar Contraditória, Amadeu Oliveira foi pronunciado nos crimes que vinha acusado e reconduzido à Cadeia Central de São Vicente onde continua em prisão preventiva.
Em 29 de Julho, a Assembleia Nacional aprovou, por maioria, em voto secreto, a suspensão de mandato do deputado, pedida em três processos distintos pela Procuradoria-Geral da República (PGR), para o poder levar a julgamento.
Em causa estão várias acusações que fez contra os juízes do Supremo Tribunal de Justiça e a fuga do País do condenado inicialmente a 11 anos de prisão por homicídio – pena depois revista para nove anos – Arlindo Teixeira, em Junho do ano passado, com destino a Lisboa, tendo depois seguido para França, onde está há vários anos emigrado.
Arlindo Teixeira era constituinte de Amadeu Oliveira, forte contestatário do sistema de Justiça cabo-verdiano, num processo que este considerou ser “fraudulento”, “manipulado” e com “falsificação de provas”.
Amadeu Oliveira assumiu publicamente, no parlamento, que planeou e concretizou a fuga do condenado, de quem era advogado de defesa, num caso que lhe valeu várias críticas públicas.
A Semana com Inforpress