PR de Cabo Verde reconhece que momento vivido na Justiça “não é fácil”

O momento da Justiça não é fácil e certamente espera-se ouvir do mais alto magistrado da Nação mais do que palavras de ocasião. Episódios recorrentes têm colocado em causa e em discussão o desempenho do sistema judicial cabo-verdiano”, afirmou o Presidente da República, ao discursar depois de dar posse, na Praia, ao novo presidente do STJ, Benfeito Mosso Ramos.

“Espero que este debate necessário seja elevado e fincado na busca de respostas para os ingentes desafios que se nos colocam em relação a este que é um dos fundamentais pilares do Estado de Direito democrático. A confiança da sociedade cabo-verdiana na Justiça, para cuja ampliação, por vital para o funcionamento global das instituições da República, todos devemos contribuir, tem de ser conquistada todos os dias pelo trabalho, pela oportunidade e qualidade das decisões”, apelou.

José Maria Neves sublinhou na mesma intervenção que “a paz social e a vida em sociedade dependem, em larga medida, de um sistema de Justiça eficiente, competente e transparente, em que os cidadãos possam confiar”, mas que “a integridade do sistema e por reflexo dos magistrados e de todos os atores da Justiça, tem sido crescentemente questionada pela nossa sociedade”.

A inquietação é gritante e não pode ser ignorada”, apontou.

Recordou que “a sociedade que confia que os conflitos sejam resolvidos através de um acesso condigno a uma instituição que analise pontos de vista, factos e provas, faça a sua comparação com a lei adequada”, para “encontrar uma solução que satisfaça, mais do que as partes ou uma das partes, a continuidade pacífica e equilibrada da vida em comunidade”.

Neste momento tão conturbado, há valiosos contributos que o STJ, enquanto órgão superior dos tribunais judiciais, administrativos, fiscais, aduaneiros e do tribunal militar de instância pode prestar, dentro das suas competências, sendo certo que não lhe cabe a gestão e disciplina dos juízes. Estamos todos cientes de que os tribunais apenas estão sujeitos à lei e que a Justiça só pode ser exercida nos tribunais, por juízes, que detêm o monopólio da tão complexa função de julgar”, afirmou.

Para que “haja um controlo e seja assegurada uma verdadeira independência deste enorme poder”, recordou que os cidadãos e as instituições “têm sempre uma possibilidade de recurso”, pelo que “se não aceitarem determinada decisão, podem recorrer da sentença para um tribunal superior”.

“Permitam-me referir que nesta dimensão, o STJ pode e deve exercer um verdadeiro controlo da qualidade técnica, do rigor jurídico e da ética e integridade das decisões, que nos termos da lei são passíveis de recurso para esta instância. Travando, assim, o combate necessário para a contínua conquista da confiança na Justiça, com o rigor da sua ação, dedicação, serenidade e coragem”, apelou o Presidente.

A confiança supõe estabilidade, coerência, qualidade, independência de julgamento, e certamente o rigor da consciência jurídica (…) Um bom teste à Justiça é sempre o bom senso. Se uma qualquer decisão não passa pelo crivo do bom senso, certamente falta-lhe credibilidade”, insistiu.

Antes da posse do novo presidente do STJ, José Maria Neves já tinha empossado em 02 de novembro dois juízes conselheiros do mesmo tribunal, o que permitiu recompor o funcionamento da instituição com os sete juízes previstos, que por sua vez propuseram por unanimidade Benfeito Mosso Ramos para presidente daquele órgão.

A ministra da Justiça cabo-verdiana, Joana Rosa, admitiu no parlamento a necessidade de aumentar a produtividade dos tribunais, para reduzir os processos pendentes, mas alertou que é preciso reduzir a demanda.

Precisamos aumentar ainda mais o nível de produtividade, por um lado, mas, por outro, precisamos adotar medidas de política visando reduzir a demanda à Justiça, sem coartar o livre acesso dos cidadãos e das empresas à Justiça, pois anualmente os tribunais recebem em média 11.900 processos e as procuradorias mais de 20.000 processos. Uma demanda elevadíssima que convém travar”, afirmou Joana Rosa, tendo como base os relatórios anuais dos conselhos superiores da Magistratura Judicial (CSMJ) e do Ministério Público (CSMP).

“Um dado não podemos deixar de salientar de início, é a tendência crescente de redução de pendências, conforme dados do relatório dos conselhos superiores. E daqui retira-se um facto que nos parece inegável, que o percurso tem produzido bons resultados. A nossa Justiça tem sido capaz de responder com maior rapidez às demandas, os nossos magistrados e oficiais de Justiça têm tido assinalável atividade, mas é possível e necessário aumentar o ritmo e produzir mais”, defendeu.

De acordo com o relatório do ano judicial terminado em julho último (2021/2022), elaborado pelo CSMJ, “nos últimos anos, o número de processos decididos tem vindo a acompanhar o número de processos entrados” nos tribunais cabo-verdianos.

O CSMJ integrava no final do ano judicial 2021/2022 um total de sete juízes conselheiros, 11 juízes desembargadores e 51 juízes de direito - mas apenas 55 no total no exercício de funções -, além 217 oficiais de Justiça, neste caso com 204 a trabalhar nos tribunais. A Semana com Lusa

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