Professores criticam atraso na promoçao do crioulo guineense e cabo-verdiano a línguas nacionais

Para o professor de crioulo cabo-verdiano, Lonha Heilmair, o "sistema quase bipartidário" de Cabo-Verde é uma das causas para o arrastamento do processo de formalização.

"Cada um quer manter o seu protagonismo e, então, não deixar que seja o outro” a concluir o processo. ’Enquanto não formos nós também não deixamos que sejam os outros’. E assim não se avança, porque um não deixa jogar o outro”, alertou.

Apesar de reconhecer que "há uma dinâmica" para o estabelecimento do crioulo como língua oficial, referindo-se ao mês de novembro em que foi fundada a Alma - Associação Língua Materna Cabo-Verdiana - constituída por "investigadores que trabalham para que a introdução do crioulo possa ser uma realidade", Heilmair afirmou que não se deve "ter ilusões a mais".

"Há sempre o movimento de travar e dizer não", acrescentou. O professor defendeu que a disputa pela atribuição das glórias políticas de cada partido tem interferido no processo.

No seu discurso de tomada de posse, em 09 de novembro de 2021, alternado entre português e crioulo, o atual chefe de Estado, José Maria Neves, prometeu estar “na linha da frente” do combate para a “oficialização plena” da língua cabo-verdiana.

Como medida de promoção do crioulo, no dia Internacional da Língua Materna, o ministro da Educação, Amadeu Cruz, garantiu a introdução da língua cabo-verdiana no ensino secundário, a partir do 10.º ano de escolaridade, como disciplina opcional.

Para Lonha Heilmair, esta é uma norma que peca pela demora. Sendo que a "vida decorre em crioulo", o facto de esta só ser introduzida numa fase tão tardia do ensino.

Na Guiné-Bisau, segundo Abdelaziz Vera-Cruz, o problema é outro. O professor de crioulo guineense considera que o impasse da oficialização da língua se deve “mais por falta de iniciativa política, de vontade política”.

Quem toma a decisão não está interessado. E paciência” desabafou Vera-Cruz, que lamentou o “preconceito a nível político em relação ao crioulo”.

Eu gostava de ver o crioulo oficializado porque na verdade, na Guiné-Bissau, a nossa língua, a língua franca da Guiné-Bissau é o crioulo. É a língua do dia-a-dia. É a língua do povo. É a língua que se usa em tudo, se faz tudo. O português, na Guiné-Bissau, é uma língua apenas da escrita, para papel e documentos oficiais. Tirando essa situação, quase o português desaparece”, afirmou.

O docente reconheceu, ainda, que o crioulo cabo-verdiano já conseguiu uma maior evolução do que o crioulo guineense para que possa ser considerada a língua oficial da Guiné-Bissau.

Quando eu digo que o nosso crioulo não reuniu condições, até esse momento, o nosso crioulo não está normalizado, ou seja, não há uma escrita, uma norma de escrita do nosso crioulo. Essa norma é precisa”, disse.

Ciente de que não se podem “dar passos a saltar degraus”, Vera-Cruz urge o Governo guineense a compilar os estudos já feitos para “formar um livro que reúna todas as regras gramaticais”.

Há estudiosos que fizeram um trabalho sobre, por exemplo, sobre substantivos do crioulo, que é uma morfologia do crioulo, que é uma área da gramática. Há estudos sobre lexicografia, por exemplo. Há até um dicionário que, por pegar isso, há um estudo sobre, por exemplo, semântica do crioulo, que são ramos da gramática”, sustentou.

O professor de crioulo guineense alertou, contudo, para o facto de não faltarem estudos e “por mais que os linguistas" façam “o trabalho, se os políticos não decidirem, fica tudo em águas de bacalhau”.

Lonha Heilmair apontou também que é necessário formar mais professores para darem aulas em crioulo. Reconhecendo que "há muita coisa que falta fazer", o professor defendeu que o caminho passa por "oficializar e fazer tudo o que é preciso para fazer jus a essa oficialização". A Semana com Lusa

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