Perfil: Eleana Semedo “Tatá” – antiga futebolista torna-se na “preta das paletes”
Eleana Semedo,
39 anos, mãe solteira, com três filhos para criar e antiga futebolista é um
exemplo de afirmação feminina, por conseguir driblar as adversidades e se
afirmar numa profissão essencialmente de homens.
A antiga meio campo da Escola de Futebol EPIF e dos Black Panthers
(deixou o futebol em 2012) é hoje uma carpinteira que trabalha essencialmente
com paletes (estrado de madeira), confeccionando desde uma simples cadeira,
passando por mesinhas, sofás, camas, estantes e outros móveis caseiros,
“conforme as indicações do freguês”.
“Tatá”, como é carinhosamente chamada, reportou à Inforpress que tudo
começou em 2015, quando “sem nada para fazer” foi convidada por um amigo, que
tem uma oficina, para aprender a “arte de trabalhar com paletes”, convite esse
aceite e recusado logo no primeiro dia de aprendizagem.
“No primeiro dia tinha que tirar os pregos das madeiras, chegando em
casa decidi em não voltar. Após insistência do amigo continuei a ir todos os
dias e depois de muitas marteladas nos dedos e outras más fases comecei a
aprender”, lembrou.
A tomada de consciência, recordou, foi quando se apercebeu que esse
trabalho poderia se transformar no seu “ganha pão”, uma vez que na altura
estava “parida” (acabava de ter um filho), situação que classificou de “muito
difícil”.
“Foi muito duro, deixar o meu filho com a avó para ir trabalhar. Fiz
esse sacrifício e até hoje estou nisso”, lembrou Tatá, vangloriando que
actualmente tem uma profissão da qual se orgulha, por ser conquistada com muito
empenho e perseverança.
“Joguei futebol desde cedo e jogar bola dizem que é lugar para homens.
Não existe separação de trabalho ente homens e mulheres, desde que seja honesto
é trabalho. Eu não tinha nada para fazer, se ficasse a esperar por um
trabalho de escritório nunca mais “, observou Tatá, afirmando que não está no
“mundo dos homens”.
Por isso, Tatá considerou que não está “numa profissão de homens”
porque, conforme defendeu, “todo trabalho é trabalho”, e, acrescentou, não existe
diferença quando o assunto é ganhar o sustento.
“Estou no meu lugar. O meu lugar é onde quero estar. Não existe lugares
de homens e lugares de mulheres. Antes jogava bola e hoje estou nessa profissão
a ganhar o meu dinheiro”, clarificou a carpinteira, que classificou a sua
passagem pelo futebol, mais concretamente pela EPIF, como uma “escola de vida”.
Actualmente, após anos de labuta, a entrevistada da Inforpress garantiu
que já ganhou o seu mercado, “num caminho trilhado sem nenhum complexo”.
“Às vezes saio toda suja para comprar paletes e as pessoas me olham de
maneira estranha por ser mulher, mas eu não ligo dado que este é um trabalho
como qualquer outro”, contou orgulhosa, afirmando ser um carpinteiro como
qualquer outro.
“Este é o meu trabalho e não tenho vergonha. Enquanto continuar a ganhar
o meu pão honestamente vou continuar e sem complexo, embora, no início, tenha
passado por alguns constrangimentos”, contou.
Neste particular, relatou que, muitas vezes, as pessoas quando chegam
para encomendar um mobiliário perguntam pelo “senhor que trabalha na oficina”,
pensando, de antemão, que só os homens podem ser carpinteiros.
“Não acreditam que uma mulher pode fazer este trabalho, mas já estou
acostumada e agora nem ligo, porque é um labor como qualquer outro “, lamentou.
Posto isto, a artista nascida e criada no bairro de Ponta Chicharro, na
cidade da Praia, apontou outros caminhos a trilhar, que passam por requalificar
a sua oficina e ensinar os jovens, “de preferência meninas” essa arte/profissão
que classificou de “digna e gratificante”.
“Eu posso ser um espelho para muitos jovens e, por isso, quem quer
aprender estou disposta a ensinar”, vangloriou.
Mas para isso, disse que terá que criar melhores condições na sua
oficina – trabalha na rua – uma vez que o “pardieiro” onde trabalha está em
ruínas e em risco de desmoronar-se.
“Trabalho na rua e às vezes lá dentro por causa do sol. É um risco
porque qualquer hora pode desabar, embora o tecto esteja sustentado com dois
barrotes”, revelou Tatá, informando que “Preta das Paletes” vai ser o nome da
sua remodelada oficina.
Quando os princípios do empoderamento das mulheres e igualdade de gênero
estão na ordem do dia, Eleana Semedo, a “Tatá das Paletes”, se considera uma
“mulher empoderada”, por ter conseguido se “reinventar”.
“Aos jovens, que queixam por falta de trabalho, digo-os para se
reinventarem, terem força de vontade, a não esperar e saberem o que realmente
querem”, indicou, Tatá, apelando a jovens mulheres para a verem como um exemplo
de afirmação.
FONTE: INFORPRESS