Fiscalização dos Direitos Humanos comprometida em Cabo Verde
A não aprovação de um novo estatuto da Comissão Nacional para os Direitos Humanos e a Cidadania, o défice no feedback das Recomendações feitas pela instituição e a fraca colaboração entre as entidades podem estar a comprometer o monitoramento e a realização dos Direitos Humanos em Cabo Verde. Dados avançados pela Comissão Nacional para os Direitos Humanos, no dia em que se assinala o Dia Internacional dos Direitos Humanos
O atual estatuto da CNDHC impede que a instituição tenha os recursos humanos e financeiros e as condições ideais para fiscalizar a implementação dos Direitos Humanos em Cabo Verde, nomeadamente no que se refere ao seguimento e avaliação das políticas públicas relacionadas com a área.
Em entrevista ao A NAÇÃO, Zaida Morais de Freitas fala em uma “fraca articulação e cooperação entre as instituições e pouca reação do Governo às recomendações feitas pela CNDHC”.
Por outro lado, a responsável aponta “uma necessidade urgente de reforço institucional”, através da aprovação de um estatuto da CNDHC e contratação de mais técnicos para melhor responder às demandas.
Cabo Verde, enquanto país democrático, analisa a presidente da CNDHC, tem apresentado inúmeros progressos no que se refere à promoção e proteção dos direitos humanos, mas também, tem-se deparado com inúmeros desafios.
“Existem dimensões que ainda clamam por políticas públicas e ações para ultrapassar os desafios existentes, com o objetivo de promover uma melhor efetivação dos direitos humanos no país”, aponta.
Neste sentido, conclui, direitos como o do acesso à saúde de qualidade, habitação condigna, acesso à água canalizada, eletricidade, segurança alimentar e emprego digno são os que devem merecer uma atenção especial. A nível dos direitos civis e políticos, a morosidade da justiça, a perceção da impunidade e a insegurança pública são os aspetos que mais devem ser melhorados.
Para Zaida Freitas, é preciso também melhorar a qualidade dos direitos de grupos específicos, tais como crianças, pessoas com deficiência, pessoas com doença mental, idosos, mulheres, migrantes e LGBTI.
Mecanismo Nacional de Prevenção precisa de mais autonomia
Através da Resolução de Conselho de Ministros n.º 98/2018, de 24 de Setembro, o Governo designou a CNDHC como Mecanismo Nacional de Prevenção (MNP), atribuindo-lhe competências para efetuar visitas regulares, com ou sem aviso prévio e sem restrição, a qualquer local onde se encontrem ou se possam encontrar pessoas privadas de liberdade. Uma forma de reforçar a proteção dessas pessoas contra a tortura e outras penas ou tratamentos cruéis e desumanos.
Esta atribuição criou a possibilidade de intervir antes da ocorrência de uma violação, o que a comissão aponta como uma grande vantagem, em termos da proteção dos direitos humanos.
Entretanto, a comissão regista ainda a ausência de uma estratégia nacional para a implementação das recomendações feitas pelos órgãos de tratados e mecanismos de direitos humanos, situação que dificulta o processo de elaboração dos relatórios que o país deve submeter regularmente.
Outro desafio tem a ver com a própria autonomia do MNP, já que o organismo encontra-se ainda na orgânica do Ministério da Justiça. “Este aspecto fragiliza o mandato do MNP e põe em causa os privilégios e as imunidades essenciais para o exercício do mandato pelos membros do MNP”, reforça Zaida Freitas.
Abuso de autoridade policial representa 11% das queixas
Durante o ano de 2020 a CNDHC analisou 115 casos de alegada violação dos Direitos Humanos, com maior incidência nos direitos dos reclusos, da criança, abuso de autoridade e agressão policial, direito à saúde, habitação e direito laboral. O abuso de autoridade policial representa 11% da totalidade das queixas.
São números que ainda preocupam, diz Zaida Freitas, não obstante os investimentos feitos a nível da formação e capacitação de agentes na matéria.
Recomenda-se, portanto, que as denúncias de agressão policial sejam “investigadas com celeridade e que os responsáveis pela prática sejam devidamente punidos”.
São denúncias recebidas através de vários meios, desde o telefone, redes sociais, email e presencialmente, mas também através da identificação e tratamento de situações divulgadas na comunicação social, que se configuram como violação dos direitos humanos.