Lei VBG: Associação aponta progressos mas admite maior conhecimento para um cumprimento integral da legislação
A presidente da ACLCVBG apontou hoje os
progressos que o País conseguiu com a implementação da Lei VBG como
“importantes”, mas admitiu que muito precisa ser feito para um maior
conhecimento e um cumprimento integral da legislação.
“É
importante dizer que houve progressos sim, mas é preciso dizer que ainda falta
um maior conhecimento da lei VBG, dos direitos constantes na lei, uma maior
articulação entre as entidades, assim como uma melhoria no atendimento,
nomeadamente, em relação à polícia”, disse a presidente Associação
Cabo-verdiana de Luta Contra a Violência Baseada no Género (ACLCVBG), Vicenta
Fernandes.
Vicenta
Fernandes, que fez essas considerações num exclusivo à Inforpress para falar
sobre os dez anos da implementação da Lei VBG, que aconteceu a 11 de Março de
2011, ressaltou que apesar das criações do programa de reabilitação dos
condenados por VBG e a tentativa de manutenção e criação dos centros de apoio a
vítimas, o país com o modelo “casa do direito” prestou um trabalho mais
“coordenado” uma vez que o apoio era prestado pelos juristas e psicólogos na
localidade de residência.
Neste
âmbito, realçou que para um melhor acesso à justiça há que haver “grandes
mudanças”, pois, o acompanhamento que deve ser feito por um advogado indicado
pela Ordem dos Advogados gera complicações visto que em muitas localidades não
existe uma delegação da ordem, pelo que muitas vítimas ficam sem apoio
jurídico.
“O
apoio jurídico tem-se revelado difícil, principalmente, nas localidades onde
não existe representação da Ordem dos Advogados, ou de uma associação na
matéria com parceria com algum advogado”, observou, realçando que com a
existência das casas do direito havia um jurista indicado para fazer
atendimento e acompanhar a vítima ao tribunal.
Vicenta
Fernandes, adiantou ainda, que experiências têm revelado que muitas vítimas de
VBG têm ficado sem apoio jurídico, apesar da lei conceder o acesso à justiça
gratuita a quem não possui condições.
Por
estas e outras, considera que no País existem lacunas entre os dispositivos
legais, as práticas profissionais e as rotinas institucionais de aplicação da
legislação, visto que nem todos os aplicadores da lei têm, de facto, aplicado a
legislação na sua íntegra.
Devido
a esta falha, afirmou que muitas vítimas têm informado que são convidadas a
desistir do processo quando chegam à procuradoria.
“Os
processos de VBG são mudados, ou seja, deixam de ser crime de VBG, para se
aplicar um outro tipo de crime, principalmente, quando a vítima manifesta a
vontade de desistir da queixa”, explica, sublinhando que, muitas das vezes, a
vontade de desistência anunciada pela vítima está ligada a ameaças ou medo do
agressor.
A
presidente da ACLCVBG, que considera a questão dos prazos de preocupante,
assegurou que este tem sido consequência do não cumprimento das datas-limite da
entrega da queixa a vários níveis, particularmente, nos outros concelhos do
País.
“É
importante ressaltar que a morosidade judicial é um factor em desfavor do
combate à VBG. Mesmo que a lei determine que um processo deve ser finalizado em
90 dias, nós deparamos com situações em que processos passam anos, e isso, para
além de colocar em perigo a vítima é desmotivante para as pessoas que fazem a
denúncia”, reconhece.
Denuncia
ainda o facto de nem todas as instituições do sector da saúde terem vindo a
garantir o atendimento gratuito às vítimas de VBG, assim como o atendimento
policial e o encaminhamento dos processos.
Neste
procedimento, indicou que ao longo do processo de capacitação das ONG no
sentido de se fazer a avaliação participativa da implementação da lei, a
associação verificou que a maioria não tem conhecimento do disposto da lei VBG.
“Se as
ONG não sabem, menos ainda sabem as vítimas. É necessário que se continue o
processo de sensibilização”, disse, ressalvando que a associação tem tentado
fazer a sua parte mesmo sem financiamento.
E
tratando-se a VBG de um exercício de poder em razão do género que é construído
socialmente, por ter raízes numa cultura machista e patriarcal, Vicenta
Fernandes, admite que na sociedade cabo-verdiana continua a persistir essa
cultura “machista e patriarcal”.
Questionada
se dez anos após a sua implementação a legislação necessita de revisão para
melhorias na sua aplicação, aquela responsável da ACLCVBG avançou que existem
coisas na lei VBG que poderiam ser melhoradas.
No
entanto, realça, que não é com a alteração da lei que se poderá alcançar
melhorias, mas sim com maior sensibilidade para a aplicação da legislação
existente.
Concluindo,
Vicenta Fernandes confirmou que a situação da pandemia contribuiu para o
aumento da VBG no país, pois, segundo sustentou, as vítimas tiveram de ficar
mais tempo em casa com o abusador.
O que
resta saber, na sua opinião, é se as pessoas alvos de violência com base no
género procuraram ajuda.
FONTE: INFORPRESS