“Nasci e cresci sem a presença do meu pai e isso me motiva todos os dias a fazer de tudo para cuidar dos meus filhos” – professor
Saidu Bangura é professor universitário, pai de
três filhos, que há 21 anos trocou Serra Leoa por Cabo Verde. As memórias de
uma infância triste são motivos que o leva a ser todos os dias um pai presente
e amigo dos filhos.
Nascido
a 15 de Março de 1975, na aldeia de Papel, na Serra Leoa, Saidu Bangura passou
os primeiros anos de sua infância com a avó, na referida aldeia, onde fez os
estudos primários, mas quando completou 13 anos, foi viver com a mãe em
Freetown, cidade onde prosseguiu os estudos.
“Da
parte do meu pai, somos 15 filhos, e na da minha mãe somos 6 filhos. Na
família, a minha mãe não teve muita sorte de construir uma família com o meu
pai, porque quando estava grávida de mim, o meu pai, que na altura era agente policial,
foi transferido e acabou por formar uma outra família”, lembra.
A sua
infância e adolescência, segundo conta em declarações à Inforpress, no âmbito
do Dia do Pai, que se celebra hoje, foram marcadas pela guerra civil que altura
decorria na Serra Leoa, ausência do pai biológico e a falta de condições
financeiras para realizar o seu maior sonho, que era um dia concluir o Ensino
Superior.
“Fui
criado pelo meu padrasto e eu era tido sempre como o filho bastardo, e isso não
foi fácil. Eu era um excelente aluno, sempre tive boas notas, mas a minha mãe
não podia pagar os meus estudos e foi com a ajuda de um reverendo e do director
da minha escola, que se disponibilizaram a pagar os meus estudos, que consegui
concluir o secundário”, lembra.
Após
concluir o Ensino Secundário, prosseguiu, com a ajuda de um tio, que o tratava
como seu filho, conseguiu se inscrever na universidade, onde se formou em
Línguas e Literaturas e com olhos marejados de lágrimas, lamenta o facto de o
mesmo não ter tido a chance de viver para vê-lo licenciado,
Em
1999, quando terminou o Ensino Superior e com um país destruído pela guerra
civil, colocou nas malas os seus planos e o desejo de conhecer outros lugares e
foi nesta altura que viu a Gâmbia como solução a curto prazo, mas ao chegar lá,
recorda, a situação também vivida naquele país não permitiu que a sua
permanência fosse longa.
Foi
então que em Dezembro de 1999, avançou, decidiu vir a Cabo Verde, onde na
altura tinha alguns familiares que aqui residiam, tendo ressalvando que veio
com a perspectiva de fazer uma passagem por Cabo Verde para depois se aventurar
em outros pontos do globo. Entretanto, realçou que o que encontrou no
arquipélago fê-lo mudar de ideias.
“Passados
21 anos a viver aqui, sinto-me um cabo-verdiano e Cabo Verde tornou-se a minha
primeira casa. Já estive em vários lugares, mas o que encontrei aqui foi
diferente, na altura por ter saído de um país que estava em guerra e chegar a
Cabo Verde e encontrar uma paz que aqui reinava, era tudo o que me podia
acontecer, então fui ficando e já se passaram 21 anos”, afirma.
Conforme
conta, após um ano a residir em Cabo Verde, conseguiu o seu primeiro emprego
como professor no Liceu Pedro Gomes, na Cidade da Praia. O seu processo de
integração não foi difícil, reconhece, não obstante as diferenças, barreiras
culturais e linguísticas que teve que ultrapassar.
Saidu
Bangura é pai de três filhos, um rapaz de 17 anos e de gémeas de oito anos. A
mãe das crianças, que é também de Serra Leoa, já se conheciam, mas foi em Cabo
Verde que tiveram uma relação conjugal, que, infelizmente, terminou há alguns
anos, e ele ficou com os filhos.
“Quando
soube que iria ser pai, foi uma emoção muito grande, mas também sabia que era
uma grande responsabilidade. Não tive a chance de ter o meu pai por perto, o
tratamento que recebia do meu padrasto não era de um pai para filho, então
quando sabia que a minha ex mulher estava grávida, fiquei emocionado e isso
mudou a minha vida completamente”, revelou.
Saidu
Bangura afiança que hoje é ele quem cuida, educa os filhos, tenta cumprir os
dois papéis e faz de tudo para que as crianças não sofram com a separação.
À
Inforpress confessa que tudo faz para não cometer o mesmo erro do seu pai e
cumprir todas as suas responsabilidades paternas.
“Nasci
sem ter a presença de um pai, só conheci ele quando tinha 13 anos e por não ter
sido criado por ele me marcou muito, sofri com isso. A ausência do pai fez-me
muita falta, mas também fez com que a minha vida fosse diferente e pude
realizar o meu maior sonho que era o de estudar e formar-me e hoje tenho o grau
de doutoramento”, salientou.
O
nascimento do primeiro filho, assegurou, não só foi uma grande emoção, como
mudou também os seus planos de vida e aumentou o seu grau de responsabilidade
não só como ser um profissional, filho, irmão, mas também como homem.
Já o
nascimento das gémeas, prosseguiu, foi um grande choque, isto porque, explicou,
não estava à espera que a vida fosse lhe presentear com duas filhas ao mesmo
tempo.
Para
o professor universitário, a melhor parte de ser pai é saber que existe um ser
inocente em casa à tua espera, que é razão de tudo, torna a vida mais alegre e
“prazerosa”, onde os problemas e o stress não têm lugar porque, sustentou,
cuidar dos filhos, dar-lhes amor e uma vida melhor compensa qualquer coisa.
“Cuidar
dos meus filhos é como preencher a infância que não tive relativamente à
presença do pai, fui criado pela minha avó, depois fui viver com a minha mãe em
Freetown, então o que tenho transmitido aos meus filhos são as coisas que
gostaria de ter recebido quando criança. Esta fase tem sido uma aprendizagem,
sobre o que verdadeiramente um pai deve fazer pelos filhos, e eu quero e faço
tudo por eles”, sublinhou.
Entretanto,
realçou a sua preocupação relativamente à educação das gémeas com a chegada da
fase de puberdade, que considera “complicada”, pelo facto de ser homem, mas
acrescenta que neste aspecto espera contar com o apoio da mãe das crianças na
orientação e ensinamentos sobre as questões femininas.
O
dia-a-dia com os filhos, referiu, é muito dinâmico, preenchido com
brincadeiras, jogos, passeios e momentos muito bons que, acredita o docente,
irá contribuir no processo de formação e desenvolvimento das crianças.
Saidu
Bangura concluiu, afirmando que a falta de um pai ajudou-lhe a entender que o
mais importante não é colocar a criança no mundo, mas, sim, ser um pai 24 horas
por dia.
De
acordo com o professor, os pais devem assumir as suas responsabilidades e
priorizar os filhos, tendo aconselhando a todos os que ainda vão ser pai, ou os
que já o são, para não abandonarem os seus filhos, mas sim cuidar, amar,
porque, ajuntou, “ser pai e exercer este papel é a melhor coisa que um homem
pode fazer na sua vida”.
FONTE: INFORPRESS