“Choque” económico em Cabo Verde “mais forte do que o previsto”
O Fundo Monetário Internacional (FMI) admite que o “choque” económico
da covid-19 em Cabo Verde “foi mais forte do que o previsto”, mas que
as medidas de apoio tomadas pelas autoridades cabo-verdianas ajudaram a
“conter o impacto”.
No relatório final sobre a terceira e última revisão do programa de
assistência técnica PCI (Instrumento de Coordenação de Políticas, na
sigla em inglês), agora concluído, o FMI alerta para as “incertezas”
sobre a duração da pandemia, que continuam a pesar sobre a economia do
arquipélago, dependente da retoma do turismo, que ameaça a recuperação
económica esperada em 2021.
“O choque da covid-19 foi mais forte do que o previsto e as
perspectivas económicas estão sujeitas a incertezas e riscos de revisão
em baixa. Embora as medidas de apoio tomadas pelas autoridades tenham
ajudado a conter o impacto do choque, a contracção em 2020 foi
significativa”, lê-se no relatório do FMI, consultado hoje pela Lusa.
O FMI estimava uma recessão económica equivalente a 6,8% do Produto
Interno Bruto (PIB) de Cabo Verde em 2020, previsão revista agora para
14% – o Instituto Nacional de Estatística aponta para 14,8% -, em larga
medida pelo impacto da ausência de turismo desde Março, devido às
restrições internacionais provocadas pela pandemia de covid-19, num
sector que garante 25% do PIB do arquipélago.
No documento, a equipa do FMI “insta as autoridades a prepararem
medidas de mitigação” contra os “riscos” de queda na retoma esperada
para 2021 – o Fundo admite um crescimento económico de 5,8% este ano – e
que, “após a crise”, as autoridades “devem manter a implementação de
políticas para apoiar a estabilidade macroeconómica e acelerar as
reformas estruturais que estimulam o crescimento” para “reconstruir os
ganhos perdidos e retornar às trajectórias de médio prazo pré-pandemia”.
Alerta igualmente para a execução do Orçamento do Estado para este
ano, que “precisará de ser monitorizada cuidadosamente”, tendo em conta
que as perspectivas económicas são “incertas”, apontando que o Governo
actual – Cabo Verde realiza eleições legislativas em 18 de Abril –
assumiu o compromisso de congelar 1% do PIB em despesas orçamentadas
para este ano, como publicidade e viagens, em função da avaliação da
arrecadação das receitas fiscais esperadas.
Para o FMI, as medidas de mitigação às consequências da covid-19 –
que envolvem linhas de crédito, moratórias a créditos bancários e de
pagamentos de impostos, ‘lay-off’ simplificado ou subsídios às famílias –
“devem continuar a ser monitorizadas de perto e eliminadas quando as
condições permitirem”.
No relatório é reconhecido que o plano de mitigação às consequências
da pandemia, lançado em Março de 2020 pelo Governo cabo-verdiano,
“ajudou empresas, famílias e grupos vulneráveis a lidar com o impacto da
pandemia”, além de “melhorar os requisitos” de segurança sanitária na
hotelaria.
Para o FMI, o plano “teve um impacto importante”, desde logo com as
linhas de crédito com garantias do Estado estabelecidas a apoiaram mais
de 500 empresas, “ajudando a proteger cerca de 12.300 empregos”, através
de 3.900 milhões de escudos (35,2 milhões de euros) em empréstimos,
incluindo para micro, pequenas e médias empresas.
Também a suspensão dos contratos de trabalho, que custou ao Estado
1.400 milhões de escudos (12,6 milhões de euros), “ajudou a salvaguardar
empregos para cerca de 32.000 trabalhadores evitando despedimentos”.
“Medidas destinadas a proteger a renda familiar ajudaram a garantir a
subsistência de famílias extremamente pobres e trabalhadores do sector
informal durante a paragem [limitações impostas à actividade no estado
de emergência]. As autoridades também tomaram medidas para preparar o
retorno do turismo, incluindo a formação de pessoal do sector hoteleiro
nas áreas de segurança, a exigência de obtenção de selo de segurança
para hotéis e restaurantes e a abertura de dois centros de saúde nas
duas ilhas turísticas, do Sal e Boa Vista”, reconhece o FMI.
O programa de assistência técnica PCI (Instrumento de Coordenação de
Políticas, na sigla em inglês), iniciado em 15 de Julho de 2019, e que
visa apoiar as reformas em curso no Estado, nomeadamente ao nível do
sistema fiscal e das privatizações, foi concluído com uma aplicação
“satisfatória”, apesar dos efeitos da pandemia de covid-19.
“As autoridades mantiveram um forte desempenho no âmbito do programa,
apesar das circunstâncias difíceis”, salienta a avaliação do FMI,
concluindo que todas as principais metas do programa foram cumpridas.
Acrescenta que a execução deste programa “apoiou os objectivos de
médio prazo das autoridades para sustentabilidade fiscal e da dívida”,
bem como “reformas mais amplas de promoção do crescimento”.
O PCI é um programa de assistência técnica disponível para todos os
membros do FMI que não necessitem de recursos financeiros no momento da
aprovação, sendo projectado para países que procuram “demonstrar
compromisso com uma agenda de reforma ou para desbloquear e coordenar o
financiamento de outros credores oficiais ou privados”, explica a
organização.