Dívida interna de Cabo Verde aumentou quase 14% desde o início do ano
De acordo com o mais recente relatório estatístico mensal do Banco de Cabo Verde (BCV), o endividamento interno do Governo central ascendia a praticamente 84.315 milhões de escudos (761,8 milhões de euros) no início do ano e foi aumentando mensalmente até ao pico registado em julho, traduzindo-se num crescimento nominal, em sete meses, superior a 11.634 milhões de escudos (105 milhões de euros).
Face à crise económica provocada pela pandemia de covid-19, com a ausência quase total de receitas do turismo desde março de 2020 — setor que garante 25% do Produto Interno Bruto (PIB) -, o Governo cabo-verdiano tem recorrido ao endividamento interno, através de Obrigações do Tesouro (maturidades longas) e Bilhetes do Tesouro (maturidades curtas), para financiar as medidas de apoio à economia e às famílias.
No final de 2019, antes da crise provocada pela pandemia, o ‘stock’ do endividamento interno do Governo central rondava os 73.343 milhões de escudos (662,6 milhões de euros).
Segundo os dados do BCV, a banca cabo-verdiana detinha no final de 2019 quase 45.628 milhões de escudos (412,2 milhões de euros) na dívida emitida internamente pelo Governo central, valor que passou para 52.055 milhões de escudos (470,2 milhões de euros) em julho, com uma ligeira queda face a junho.
O parlamento cabo-verdiano rejeitou em 28 de julho passado a proposta governamental para “flexibilização temporária” das regras orçamentais devido à pandemia, para permitir um aumento do endividamento interno que o executivo considerava crucial para manter as medidas de mitigação da crise.
A proposta de lei de flexibilização temporária das regras orçamentais devido à pandemia de covid-19 foi apresentada pelo Governo à Assembleia Nacional, alegando a crise financeira provocada pela ausência de retoma do turismo, mas carecia de uma maioria de dois terços dos deputados, tendo reunido 41 votos a favor, do MpD (maioria) e da UICD (oposição), dos 46 que necessitava para fazer passar a medida, além de um voto contra.
Em causa estava a intenção de aumentar em 2021 de 3% para 5% do PIB o limite do endividamento interno – para chegar a quase 80 milhões de euros -, para compensar a queda no PIB projetado e na arrecadação de receitas, mas a abstenção dos deputados do Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV) acabou por travar a proposta governamental.
Esta votação terminou com várias horas de debate no parlamento, depois de o Governo e a maioria que o suporta ter dramatizado a necessidade deste aumento do endividamento interno, no quadro da proposta do Orçamento Retificativo para este ano, que estava a ser discutido em simultâneo.
Isto, alegou o Governo, para manter os apoios às empresas, famílias e economia, face à queda de 12,2% na previsão de arrecadação de receitas do Estado, tendo em conta o inicialmente estimado, pela ausência de retoma económica, e alegando que é um mecanismo mais rápido do que a negociação de empréstimos concessionais com entidades internacionais.
Do lado do PAICV, a posição assumida na votação foi explicada com a possibilidade de o Governo eliminar “gorduras e despesas” para financiar o Orçamento Retificativo para este ano, enquanto os deputados do Movimento para a Democracia (MpD) alegaram “vingança” do maior partido da oposição pela recondução do partido na liderança de Cabo Verde nas eleições legislativas de abril último, para ter “ganhos políticos baratos”.
Durante o debate desta proposta, o vice-primeiro-ministro e ministro das Finanças, Olavo Correia, defendeu que a mesma permitiria ao Estado “continuar a intervir nas esferas económica, social e sanitária”, no quadro da pandemia.
“O Governo precisa de meios financeiros para intervir já”, afirmou Olavo Correia, alegando ser incompreensível que os parceiros internacionais estejam a “colaborar” com a concessão de moratórias ao crédito do Estado e que “no plano interno” não se faça o trabalho de mitigar as consequências económicas da pandemia.
Na primeira versão da proposta de lei do Orçamento Retificativo para este ano estava prevista a autorização para o Governo aumentar o endividamento interno líquido para 8.800 milhões de escudos (79,7 milhões de euros), um crescimento de 50% face ao regime anterior (que se manteve, face ao chumbo da proposta no parlamento), “para fazer face às necessidades de financiamento” do Estado e contando com esse pedido de alteração.
Cabo Verde vive uma profunda crise económica e social e registou em 2020 uma recessão económica histórica de 14,8% do PIB, quando antes da pandemia previa crescer mais de 6%.
Na proposta de revisão do Orçamento do Estado foi ainda revisto em baixa o crescimento esperado do PIB para de 3,0% a 5,5%, quando o Orçamento anterior previa um crescimento económico de 6,8% a 8,5%. A Semana com Lusa