Caso da violação da liberdade da imprensa em Cabo Verde: AJOC considera de irresponsáveis os pronunciamentos do Governo

A liderança do Sindicato dos Jornalistas de Cabo Verde (AJOC) considerou, hoje,23, de «irresponsáveis» os pronunciamentos do Governo, através do ministro Abraão Vicente e do Primeiro-ministro, relativos à notícia da Lusa, difundida por vários órgãos da comunicação nacional e estrangeira, sobre o recente Relatório do Departamento do Estado norte-americano relativo a Direitos Humanos, que assinala «a violação da liberdade de imprensa em Cabo Verde». O mesmo sindicato alerta sobre o caminho perigoso que o actual executivo está a seguir, «de sempre que as noticias não lhe agradarem, classificar as mesmas como fake news»(falsas notícias).

Em comunicado remetido ao Asemanaonline, a AJOC contextualiza que face às notícias publicadas pela imprensa cabo-verdiana sobre o assunto, o gabinete do ministro de Cultura e Indústrias Criativa emitiu o comunicado, onde manifesta um expressivo desprezo e uma profunda falta de respeito pelos profissionais cabo-verdianos da comunicação social, que, em suma, são acusados de ser incapazes de interpretar um documento e de, no caso vertente, se terem limitado a fazer copy paste, e mais grave ainda, de tentativas de manipulação.

«O comunicado do MCIC e o Primeiro-ministro (em declarações anteriores), acusam, por outro lado, os jornalistas e os órgãos de Comunicação Social cabo-verdianos de terem publicado acriticamente o tratamento dado pela LUSA ao relatório do Departamento de Estado e de estarem a ser “capitaneados” pela agência, como se se tratasse de uma cabala orquestrada por esta contra o Governo de Cabo Verde e secundada de forma desonesta pela imprensa cabo-verdiana», lê-se na nota de AJOC remetido a este diário digital.

Diante de tais pronunciamentos, «que considera irresponsáveis», a AJOC condena o tratamento dado à Comunicação Social pelo ministro que tutela o sector e reafirma a sua confiança na capacidade, na idoneidade e na seriedade da classe jornalística cabo-verdiana.

«A direcção da AJOC estima que é perigoso o caminho que está a ser seguido pelo executivo de, sempre que as noticias não lhe agradarem, classificar as mesmas como fake news, tentando, dessa forma, descredibilizar a imprensa cabo-verdiana», contesta a organização representativa dos profissionais da comunicação social presidida por Carla Lima.

Insurgindo-se contra tal tentativa, a AJOC chama a atenção para a necessidade de incremento da cultura e literacia mediáticas, a bem da democracia cabo-verdiana que tem, na Comunicação Social, um dos seus pilares e parceiros fundamentais.

Relatório e liberdade de imprensa beliscada

Referindo-se às conclusões do Departamento do Estado dos EUA, AJOC faz questão de congratular-se com o acompanhamento que o Governo dos Estados Unidos faz da situação dos Direitos Humanos em Cabo Verde, com especial referência à Liberdade de Imprensa. Um item que pela primeira vez é, segundo a mesma fonte, incluído no relatório, o que, por si só, justifica o destaque que mereceu da Comunicação Social nacional e não só.

«Com efeito, o relatório é claro quando refere que durante o ano transacto, a liberdade de imprensa foi beliscada, e cita como exemplo o que aconteceu entre o ministro que tutela a Comunicação Social e a classe jornalística, sublinhando que, nenhuma medida foi tomada pelo executivo na sequência dos actos e declarações protagonizados pelo MCIC, e das consequentes reacções da AJOC e dos jornalistas, e que o assunto acabou por morrer sem que nenhuma das partes tivesse recuado», fundamente o AJOC.

Conclui que isto por si só constitui um libelo dirigido ao Governo, querendo significar que, face ao acontecido, alguma coisa teria de ser feita pelo executivo, o que, claramente, não aconteceu, deixando em aberto um espaço potencial para futuras práticas de interferência do poder político na esfera de actuação dos jornalistas.

"As questões mais relevantes em matéria de Direitos Humanos incluem privação arbitrária da vida, uso excessivo da força pela polícia e agressão a pessoas detidas, tratamento desumano e castigos degradantes, detenções abusivas, violação da liberdade de imprensa pelo Governo, corrupção, tráfico de pessoas, falhas na protecção das crianças face à violência e a trabalhos perigosos, além de falhas na protecção aos trabalhadores migrantes", eis uma parte, na óptica do AJOC, importante do Relatório dos EUA que não é citada no comunicado do Governo de Ulisses Correia.

Reconhece a AJOC que nos parágrafos seguintes o relatório reafirme que há liberdade de imprensa em Cabo Verde - o que é globalmente verdade- mas realça que «o documento não deixa de citar, expressamente, os factos ocorridos em Março de 2017, envolvendo o ministro que tutela a Comunicação Social - Abraão Vicente».


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